Este sonho estava preanunciado quando foi conhecida a “maioria absoluta dos socialistas em 2022”, na altura em que Marcelo, o senhor Sousa de Belém, referiu – sem sustentação na lei nem na Constituição-, que se tratava de uma maioria “de uma pessoa” (o até aí amigo Costa, o primeiro-ministro) e que a mesma não seria considerada na eventualidade de o secretário-geral do PS optasse por aceitar outro cargo, no decorrer do prazo da legislatura.
Esta lembrança não foi surpreendente. A criatividade do presidente é conhecida, sustentada que tem sido numa legitimidade que ele entende sem limites. E por isso “segurou” Costa e o PS na luta contra o PSD de Rui Rio, recebendo em troca o apoio dos socialistas na sua reeleição presidencial. O que fica disto: o interesse de Marcelo, o senhor Sousa de Belém, ficou garantido.
As trapalhadas do Governo socialista são conhecidas, graves mas também normais: existe liberdade de imprensa, a justiça actua de forma independente e os casos – exactamente isso isso, os casos -, porque os crimes é outro assunto -, devem ser enfrentados com segurança, sem medo mas com uma atitude justa que não faça com que a partir dos casos passemos para problemas ainda maiores, eventualmente bem mais complicados como pode ser a nova situação política criada com a antecipação das eleições.
Durante a campanha falamos aqui da política dos três vintes! Isto é, referimos a alteração substancial que poderia acontecer se do resultado das eleições de 10 de março aparecessem como “vencedores” três partidos: PSD, PS e Chega. Foi o que aconteceu, criando um parlamento – fonte da democracia, e não de Belém – com uma maioria mas sem garantia de estabilidade na governação.
Os Resultados – A Viragem à Direita
Depois da viragem, a salada que vem aí!
Os dias que vão chegar
O que temos: AD com a vitória mais curta de sempre, o Chega acima do PRD e um PS ao nível de 2015
O Chega e o Livre foram quem mais cresceu em votos. Os 106 mil votos que Montenegro teve a mais do que Rui Rio chegaram para vencer um PS que perdeu 500 mil votos (a segunda maior queda da história do PS). Ventura bateu o recorde. As ‘vitórias’ do Bloco e IL foram ligeiras, e a CDU resistiu.
Este cenário será uma praia para as experiências e manobras de Marcelo que a partir de Belém, e com estaleiro no Expresso, fará desaguar na “fonte” as aspirações que ainda lhe habitam na alma.
Cabe a cada partido fazer o seu caminho. E a democracia tratará de pedir ao povo que a cada momento se pronuncie, bastando para isso novas eleições que não deverão demorar muito. Seja como for, queiramos ver ou não, perceber ou não, gostemos ou não, os factos estão ai e são os seguintes:
- O PS pode e deve queixar-se da precipitação do Presidente que deveria manter a maioria parlamentar estável desde 2022;
- O PS apresentou ao PR soluções para o cargo de Primeiro-Ministro e essa era a solução para a estabilidade política no Parlamento;
- O PS estava em convulsão interna com a campanha de Pedro Nuno Santos no partido com visão contrária à da governação de António Costa;
- O PR entendeu que a contestação de PNS a Costa era motivo suficiente para testar a unidade do partido e verificar a sua implantação eleitoral;
- O PSD estava a cimentar a liderança interna de Luís Montenegro e verificava o relativo entusiasmo das bases na volta a Portugal que ele desenvolveu, visitando todos os concelhos;
- O PSD desejava as eleições antecipadas para mais tarde, provavelmente depois das europeias, altura em que os próprios críticos internos achavam chegada a altura de propor eventualmente uma nova liderança, com o sonho escondido de voltar a olhar para Pedro Passos Coelho;
- O PR nunca “morreu de amores” por Pedro Passos Coelho, numa relação de mútuo desinteresse, aliás manifesto em várias circunstâncias;
- O PS escolheu para secretário-geral PNS tido como o “radical de esquerda” e derrotou José Luís Carneiro, o “moderado”
- Luís Montenegro revelou-se na campanha como líder capaz de apresentar uma alternativa política e deu mostras de serenidade e de competência no discurso político. E percebeu-se que começou agora a sua vida política, coisa que lhe será garantida pela exposição mediática – como aconteceu com António Costa, depois de 2015;
- O Parlamento tem uma maioria de centro/direita e a esquerda precisa de encontrar uma linguagem de afirmação que deixe os modelos antigos.
- O eleitorado mais “letrado” votou no centro/direita numa alteração evidente; verificando-se que, sobretudo o PS, desenhou trincheiras nos mais velhos mas perdeu nos mais novos.
- O protesto do Chega é muito complexo: agrega saudosos do antigo regime – muitos mesmo! – e pessoas que foram “votar pela primeira vez” – daí a abstenção ter baixado – mas também antigos eleitores do PCP, do PS e do PSD.
- A análise política que é feita nos Órgãos de Comunicação Social, sobretudo nas televisões, é desadequada da realidade. Discutem a pessoalização das questões e evitam tratar da realidade social e política que é esta: Portugal – um país pobre que tem tudo para ser desenvolvido. Mas para discutir isso é necessária uma mente aberta e liberta do ilusionismo político permanente que tomou conta do nosso país em 2015 com a “geringonça” de António Costa e a eleição do senhor Sousa, o nosso Presidente da República.
Por Arnaldo Meireles