Dezenas cá fora, lá dentro muita gente, poucos funcionários que embora dedicados e competentes olhem para a avalanche dos olhares com infinita paciência.
Não confessam o que lhes vai na alma, mas a gente adivinha: têm noção do serviço público que prestam.
Nas últimas semanas muito correio ficou a monte por todo o país, nas estações do CTT. Circuitos de distribuição ficaram por fazer, e os clientes – esses eternos clientes que agora são chamados de utentes – vá-se lá saber porquê – acorrem à porta da estação questionando o chefe pela carta que esperam, não foi entregue, mas gostaria de saber por onde anda?
Na resposta ficou a saber que “vai ver”, “espera que seja possível”, mas não tem culpa da “falta de pessoal”:
- “Olhe minha senhora, ainda há dois dias vieram dois rapazes novos para trabalhar; foram-se embora, não aguentaram uma semana”
- “Pois é! Mas olhe, pode ver se a minha carta da reforma já chegou?
Alguns minutos depois a minha vizinha sorriu, atirando os olhos para as mãos do chefe-da-estação:
. “É a senhora Ermelinda? Pois cá vai” . E o correio foi entregue.
As horas passadas à porta do correio servem também para outras coisas. Por exemplo ouvir o que é dito em surdina, por vezes entre dentes, não vá o “mafarrico” ouvir:
- “Tanta gente meu Deus, mais de quarenta cá fora e outros tantos lá dentro”!
. “Porque não recebes na conta do banco?”
. “Eu, no Banco! Lá se ia a reforma, caraças! Na na, eu levanto, levo pra casa e mostro ao Jaquim; depois guardo e pronto, mas olha lá, porque demora hoje tanto tempo?”
. “Não sei, já ouvi dizer que não têm dinheiro para descontar o vale!”
. “Então vale-te de muito, mas não haverá dinheiro?
Verificou-se que a falta de dinheiro era falso alarme, mas o burburinho andava a percorrer as bocas da maioria. E é assim que dos burburinhos se passa aos boatos e destes às “notícias” que quando o forem podem ser para anunciar a revolta dos pobres. Que nunca ninguém venceu.